Sennheiser IE800

INTRODUÇÃO E ASPECTOS TÉCNICOS

IMG_6261Não há dúvidas de que a Sennheiser é líder em fones de ouvido. Acho, aliás, que a maior quantidade de clássicos vem justamente da gigante alemã: HD414, HD 25-1 II, HD600, HD650, HE90 e, agora, HD800. Esse último modelo, aliás, foi um verdadeiro marco na história não só de fones de ouvido, mas também de alto-falantes dinâmicos em geral. Ele representou, sem dúvida alguma, um grande avanço nessa tecnologia.

A marca demorou um pouco para entrar no mercado de in-ears, e seus primeiros modelos mais sofisticados foram o IE6, IE7 e IE8. Esse último até fez algum sucesso, mas me parece que foi muito mais pelo fator novidade, tanto que rapidamente perdeu espaço para outros fones, mesmo quando foi revisado e se tornou o IE80.

Em 2013, no entanto, a marca lançou um in-ear topo de linha que parecia, assim como o HD800, trazer diversas soluções técnicas nunca antes vistas. Ele é, assim como todos os outros fones da marca – exceto os antigos HE60 e HE90 –, dinâmico, contrariando a atual tendência de produzir earphones de armadura balanceada. Seu alto-falante, porém, é o menor dinâmico XWB (extra wide-band) já colocado em fones de ouvido, com apenas 7mm de diâmetro.

A vantagem de um diafragma tão pequeno é que ele deixa espaço para o desenvolvimento de uma parte quase tão importante quanto o alto-falante em si: o corpo. Afinal, um alto-falante interage com seu meio, e é importante que essa interação seja muito bem esculpida. No IE800, isso é feito com um corpo de cerâmica bem curvilíneo, e com duas portas que, de acordo com a marca, conseguem eliminar alguns picos tradicionais em in-ears, mais precisamente em 7kHz e 8kHz.

Esses avanços, porém, vêm a um custo: o preço de tabela do IE800 é de assustadores 999 dólares. Está, porém, na nova leva de universais que ultrapassam a barreira dos 500 dólares. É uma tendência curiosa, porque é exatamente o que aconteceu com os full-sizes.

Sennheiser_IE800_Photo_ExplodedAntigamente, os topo de linha tradicionais eram Sennheiser HD600, AKG K701, Grado SR325i e Beyerdynamic DT880 Premium, todos custando aproximadamente 500 dólares. Surgiram, então, Sennheiser HD800, Grado PS1000, Beyerdynamic T1 e, agora, AKG K812 Pro – todos ultrapassando a marca dos mil dólares. É o que está acontecendo com in-ears não customizados: os tradicionais Shure SE535, Westone W3 e W4, Sennheiser IE8, Earsonics SM3 e alguns outros, que giravam em torno dos mesmos 500 dólares, estão sendo ofuscados por IE800, AKG K3003i, Shure SE846 e Ultrasone IQ, que ultrapassam facilmente essa barreira.

Tenho um certo problema com isso, porque acho que o mercado que aceita pagar quase mil dólares num mero in-ear é composto, majoritariamente, por audiófilos que procuram desempenho a qualquer custo – e, para isso, os customizados, como os JH Audio e Unique Melody, são mais indicados. Lembro que encontrei defeitos relativamente sérios em todos os universais que já ouvi, algo que não acontece com os customizados que já tive a chance de escutar. Então, apesar de um pouco cético, estive curioso para descobrir como um universal desse calibre se comportaria.

 

ASPECTOS FÍSICOS

O IE800 é surpreendentemente pequeno. Está entre os menores universais que já vi, e isso é uma vantagem, por trazer conforto. Afinal, é leve e o encaixe nos ouvidos é raso. Isso faz com que o isolamento não seja o melhor do mundo, mas sinceramente prefiro ter um fone confortável que isole bem do que um desconfortável que isole excepcionalmente bem. São inclusos 5 pares de ponteiras, inclusive duas ovais, que são as que mais me proporcionam conforto. O problema é que elas são proprietárias, então, infelizmente, nada de Comply.

IMG_6220Também é incluso na caixa, além de uma ferramenta de limpeza, uma caixinha de couro para transporte. Está entre as melhores que já vi – além de uma plaquinha com o número de série do fone, o que traz a impressão de ser algo realmente luxuoso, a forma de enrolar o cabo é muito bem pensada. Ele é enrolado pela lateral e, quando totalmente enrolado, tem seu plugue justamente alinhado com dois pequenos orifícios onde se encaixa o plugue P2. É uma daquelas soluções simples mas muito bem pensadas e executadas.

Os elogios, infelizmente, param por aqui. Primeiro de tudo, o IE800 não possui cabo removível. Considero esse um problema considerável num fone de mil dólares – afinal, quando um fone apresenta algum defeito, 99% de chances de ser no cabo. Ele é, porém, subdividido em dois, assim como o antigo Shure SE530. Ou seja, o divisor Y possui um plugue P1, que é conectado a uma extensão. Só que essa conexão acaba se tornando algo pesado e que fica, conforme andamos, batendo no peito e trazendo o que é um dos maiores problemas desse fone: microfonia.

Acho que nunca ouvi um fone tão microfônico assim. O cabo me parece resistente e é muito mais rígido do que sua aparência sugere, e por isso qualquer fricção é ouvida claramente. Até minha pequena barba é fonte de intensa microfonia. Esse problema poderia ser resolvido se usássemos o fone com o cabo por cima das orelhas, ou seja, virado para cima. Só que, com o IE800, isso não é possível. O comprimeiro do cabo até o divisor Y é pequeno, e consequentemente, se eu colocar o cabo por cima, sou enforcado. E mesmo se não fosse, a extensão também é curta, e eu não conseguiria colocar o iPod no bolso.

Por isso, apesar de gostar do conforto e da aparência do IE800, acho que esses erros são inadmissíveis num produto desse preço.

 

O SOM

IMG_6249Minha primeira impressão com o IE800 é que definitivamente estamos falando de um fone dinâmico. É uma personalidade fundamentalmente diferente das armaduras balanceadas, e tem algumas vantagens. O som é muito coerente, e parece mais linear e refinado do que aqueles de armadura balanceada – que têm, naturalmente, maior granulação. O que não significa, no entanto, que as armaduras não tenham suas vantagens. Afinal, não é a toa que ainda são maioria no mercado nessa faixa de preço.

A sonoridade é levemente em V, apresentando graves e, principalmente, agudos acentuados. O incremento nos graves, felizmente, é colocado numa região muito baixa, o que faz com que não haja interferência na região média. Na maioria das músicas, ganha-se peso e chão de certa forma. Como o IE800 não possui o melhor isolamento do mundo, é uma forma interessante de compensar os ruídos do ambiente.

Esses graves, inclusive, têm ótima qualidade. Em momento nenhum acho que são exagerados ou que haja gordura excessiva. Só em algumas gravações gostaria que eles fossem um pouco mais comedidos. Por exemplo, na The Book of Right-On da Joanna Newsom. Algumas cordas parecem embolar um pouco. Vale dizer, porém, que essa situação não é comum. Na maior parte do tempo, posso dizer que gosto do incremento do IE800.

Há bastante impacto e boa definição. Escuto exatamente o que está acontecendo na cozinha da música. O problema é que a definição não chega no nível daquela do JH13 Pro. Está mais próximo do Sony EX1000, e arrisco dizer que ainda prefiro os graves do japonês – que são, pelo que lembro, mais suaves e redondos. O IE800 tem mais punch, mas isso é algo que eu não valorizo e, de certa forma, que até desgosto. Prefiro graves gordos e autoritários a graves excessivamente secos e com muito impacto. O IE800 está num meio termo, mas o EX1000 vai mais para onde gosto.

IMG_6258Além disso, não consigo parar de pensar que seu preço é o mesmo do JH13 Pro… que, incidentalmente, tem graves exemplares. Têm textura impressionante e uma capacidade incrível de aparecerem como uma parede quando são chamados e de ficarem em total silêncio quando não são. São capacidades que o IE800 simplesmente não tem.

Onde esse in-ear mostra excelência, porém, é na região média. Costumo preferir a apresentação de dinâmicos nessa região, por eles apresentarem uma suavidade e uma linearidade incomum em armaduras balanceadas – que, em contrapartida, têm maior granulação. Uma das poucas coisas que me incomodava no JH13 Pro, inclusive, era a sensação de uma certa característica “plástica” nos médios, não sei explicar bem. E isso não acontece aqui. Não ouço, em compensação, o calor que ouvia no in-ear customizado ou ainda a maior presença dos médios, algo que costumo apreciar.

Em compensação, não posso negar que os médios do IE800 me impressionaram muito positivamente. São excepcionalmente claros e transparentes, e apresentam uma personalidade típica de falantes dinâmicos de altíssima qualidade. Eu os classificaria como frios, mas é interessante observar que, ao contrário da vasta maioria dos fones que conheço assim, eu o consideraria um bom all-rounder. Não tanto quanto o JH13 Pro ou até mesmo outros in-ears, mas nesse quesito ele é muito superior ao IEM que mais se aproxima dele que já ouvi, o Sony EX1000. Ouvir rock nele é uma ótima experiência, mesmo sem o calor e a autoridade proporcionada por outros fones. Música eletrônica, devido aos graves e agudos acentuados, também sai ganhando.

Em músicas acústicas, jazz e música clássica seu desempenho, principalmente nos médios, é excepcional. A capacidade de resolução desse falante dinâmico é altíssima e tudo é apresentado de forma coerente e com enorme transparência e detalhamento. E, para melhorar, esses detalhes não são apresentados de forma rude ou escancarada.

IMG_6247Essas capacidades são enaltecidas pelos agudos muito proeminentes do IE800. Mas eles são uma faca de dois gumes. A questão é que eles são muito proeminentes – é um incremento que me parece o do EX1000, mas é menos agressivo e se situa em regiões bem altas. O resultado me deixa confuso: no início eles me incomodaram bastante, e ainda são fonte de considerável fadiga auditiva. Para piorar, trazem um problema sobre o qual já falei diversas vezes: são finos e a apresentação do timbre de alguns instrumentos é prejudicada. Achei interessante observar que já falei sobre essa questão diversas vezes com outros fones, mas nunca havia lido algo parecido. No IE800, porém, vi que não estou sozinho nessa consideração. Isso me mostra que o problema é acentuado.

Por exemplo, analogias que li e achei realmente apropriadas – conseguiram descrever o problema melhor do que eu havia conseguido: baquetas soam como lápis e aplausos parecem papel celofane sendo amassado. É o que acontece com esse fone. Ouço um detalhamento excepcional e gosto da posição dos pratos, mas o timbre não me parece correto. Os agudos são mais finos do que deveriam ser, e falta corpo.

Porém, o lado positivo desse equilíbrio tonal é um refinamento impressionante. Atualmente associaria refinamento a uma sonoridade como essa, que me parece muito elegante: enorme transparência, arejamento, recorte e resolução, trazidos pela relação característica entre os médios relativamente recuados mas abertos e agudos proeminentes. É como se o JH13 Pro, mais autoritário e quente, soasse mais como um monitor de estúdio: se dá bem com qualquer coisa. Já o IE800 é como um sistema high-end para audiófilos, mais chique e refinado porém mais temperamental.

Em termos de espacialidade o Sennheiser não decepciona, mas não impressiona. É parecido com o EX1000, devido principalmente ao encaixe raso, mas não me parece tão expansivo, apesar de o posicionamento dos instrumentos ser mais preciso. Considero um pouco melhor que o JH13 Pro, que devido ao seu maior isolamento, acaba distanciando mais o som que sai dele com o do ambiente, o que traz a impressão de um som menos ambientalizado, coisa que o IE800 faz.

IMG_6242Onde o IE800 mais deixa a desejar, quando comparado a seu companheiro de preço customizado, é na dinâmica. Uma das coisas que mais me impressionou no JH13 Pro, além do equilíbrio tonal espetacular, foi a capacidade absurda de mostrar as variações dinâmicas. Falei sobre isso em sua avaliação. Uma música que me mostrava isso era a Lying From You, do Linkin Park (é, pois é…). A música começa com um efeito que soa pequeno e restrito. No entanto, quanto o resto entra, era como se o fone jogasse uma parede em cima de mim. Quase todos os fones que já ouvi até hoje parecem mostrar sempre um espaço já projetado, e mesmo nas passagens menores, deixam o leitor ciente do tamanho do qual podem ficar. No JH13 Pro esse não era o caso. Não havia preparação para o tamanho do som que ele conseguia projetar. My Sacrifice, do Creed, também mostra bem essa característica.

E, nesse aspecto, o IE800 não surpreende… pelo contrário. Para mim ele sempre soa, literalmente, pequeno. Apesar da espacialidade muito competente, ele não consegue driblar seu tamanho e trazer a percepção de um som grande, como alguns in-ears fazem. O JH13 Pro é um prodígio, mas mesmo outros fones menos impressionantes conseguem proporcionar um som maior. E acho que essa característica é importante num in-ear desse preço, quanto mais num universal. Ele deve surpreender… coisa que o IE800 não faz comigo.

 

CONCLUSÕES

Tenho sentimentos mistos quanto ao Sennheiser IE800. Durante esse tempo que passei com ele, aprendi a apreciar muito o que ele faz.

IMG_6257Sua personalidade é excepcionalmente refinada, e ele traz uma sonoridade aberta e arejada, com graves presentes, médios fantásticos e agudos proeminentes e com respeitável competência. Em músicas acústicas, gosto muito do resultado. E, em gêneros mais pesados, ele não exatamente decepciona.

Mas ao mesmo tempo, falta alguma coisa. Em momento nenhum fiquei impressionado com ele. Assim como com o HD800, quando o tive, simplesmente não me emocionei. Nunca houve aquele momento “uau!”. E isso, num fone de quase mil dólares, deveria acontecer – principalmente porque era algo que acontecia diariamente com meu antigo JH13 Pro.

É bem possível que pessoas que buscam uma sonoridade mais fria, analítica e refinada prefiram o IE800 ao JH Audio. Mas ainda assim, me pergunto se não existem fones customizados que tenham essa personalidade e que, por serem desse tipo, não apresentem os defeitos que ouvi no Sennheiser: problemas físicos, agudos algo exagerados e graves sem a última gota de textura e definição e som pequeno, com dinâmica mediana.

Há, no entanto, uma chance para o IE800: não há como negar que, se conveniência for necessária, é impossível bater um universal. Não temos que nos preocupar com moldes, revenda, encaixe… é tirar da mochila e colocar. Essa é sua grande vantagem em relação aos customizados. O problema é que ele traz essa vantagem a um custo.

E se a clientela que está disposta a pagar mil dólares por um in-ear aceita compromissos… é outra história.

 

Sennheiser IE800 – US$999,95

  • Driver dinâmico único
  • Impedância (1kHz): 16 ohms
  • Sensibilidade (1kHz): 125 dB/1V
  • Resposta de Frequências: 8Hz – 41kHz (!)

 

Equipamentos Associados

Portáteis: iPod Classic, Sony PHA-1, FiiO E17, FiiO E12

Mesa: iMac, Abrahamsen V6.0, HeadAmp GS-X, Woo Audio WA3

16 Comments
0