Nota do Editor: Como costumo dizer, reviews não são nada além de impressões pessoais, subjetivas, do autor. Por isso, como o Matheus, nosso novo articulista, também adquiriu recentemente um AudioDream AD8, achei que seria muito legal termos a perspectiva de uma outra pessoa com relação a este fone que tanto me encantou.
Introdução
Antes de começar essas impressões, preciso começar dizendo que minha experiência com earphones é baixa. Por isso, de pronto, saibam que a narrativa aqui é de impressões com menos “tecnicalidade” e impressões sensoriais, fruto da caminhada em circunaurais e do fato de gostar, muito, de música – e, por fim, como as ouço no Audiodream AD8. Antes deste, tive o DUNU DN2000 e uma tentativa com o KZ ZS6. Digo tentativa porque é preciso informar que sou pessoa com deficiência e isso influencia muito na minha relação com earphones de modo geral. Eles não costumam ser acessíveis em 99% das vezes. O DUNU DN2000, por exemplo, não foi. O ZS6 da KZ, menos ainda (o pior em acessibilidade). E os AKG que acompanham os Galaxy mais recentes da Samsung, um pouco melhor que o DN2000. Earburds, entretanto, sempre foram melhores de usar, mas definitivamente, foi nos IEM’s custom que encontrei a solução ideal para mim. E da experiência com o AD8, pretendo ter pelo menos mais um que seja complementar. Dito isso, vale a pena contar como conheci os custom. E falar disso é falar dos donos da AudioDream (AD), pois até conhecê-los, pra mim só existiam earbuds, in-ears, on- e over-ears.
A AD é uma empresa em que duas pessoas casualmente se encontram, num dado momento da vida. O Rene, na busca por um fone de múltiplas armaduras e a assinatura de sua preferência, resolve buscar um fabricante que possa atender esse desejo. Após algumas buscas e experimentações, ele acaba propondo para uma das fabricantes nacionais deste tipo de fone, o desenvolvimento de um mais voltado para audiófilos. E, com isso, acaba encontrando o Matheus. Assim, os dois, juntos, modificam um fone dessa fabricante para chegar na assinatura específica do agrado deles. Conheci os dois em um pequeno evento de apresentação e degustação promocional do Kuba Disco, em um bar, onde também acabei conhecendo pessoalmente o Leonardo, escritor principal deste site.
E o som?
Comprei o AD8 em meados de Junho. Portanto, já se passaram 3 meses de bastantes audições. E quando digo bastante, é porque o AD8 veio justamente no intuito de me proporcionar uma audição de muita qualidade, porém na rua, algo que sempre senti falta após avançar no sistema de mesa. Na época, estava com o Focal Clear, Hifimans HE-6, HE500 e HE560, portanto, excelentes fones. E queria ter esta qualidade no ambiente de trabalho. Pude ouvir três vezes, com calma, o AD8 universal antes de realizar a compra. Nessas oportunidades, fiquei vislumbrado com a qualidade do produto. Acabei comprando.
Como disse no início, as primeiras audições me impressionaram, pois a experiência em earphones, e até mesmo em sentido geral no hobby, está em formação e há muito aprendizado pela frente. Antes de ter o AD8, nunca me imaginei fã de fones analíticos e neutros, e a essa altura já tinha ouvido o HD800 e não ficara impressionado. E essa era a denominação que o Rene dava para o flagship da marca. Acontece que o AD8 é o fone mais analítico que já ouvi e hoje, caminhando, isso se torna um elogio dos maiores. É como o Leonardo falou em seu texto: fora as questões da própria impossibilidade da neutralidade absoluta em sistemas de reprodução, é possível que o AD8 esteja entre os fones mais “sem voz” que exista, ao lado – me perdoem alguma heresia – do JH13 Pro. É a leitura que faço, dentro de certos limites e na linha de raciocínio que compartilho com o meu colega de análise de fones: o que é neutralidade? Para mim, ela pode ser algumas coisas, dentro de respostas de frequências diferentes – LCD-X, Ether Flow, Hifiman HE-6, HD800 e Orpheus 2 (HE-1); o AD8 e o JH13 Pro.
Este fone me agradou muito e estou plenamente satisfeito com o que, e como, ele apresenta a música. A palavra que muitas vezes me vêm a cabeça é “realidade”. Sei que, na rua, com todos os seus ruídos e direto de um smartphone, essa sensação não é tão comum como quando em casa, sentado e plugado no set de mesa. Porém, após ouvir o Focal Utopia, numa breve sessão na casa de um amigo, acabou que, para mim, ele se tornou um divisor de águas nesse entendimento sobre realidade, naturalidade e organicidade. Pude também ter um novo convívio com o HD800, agora em casa, com gravações de referência e num set de mesa digno – Fostex HP-A8, Burson Soloist SL e o Soloist. Disso, passei a perceber como o AD8 se aproxima sim dessa percepção de real e natural.
Para mim, a características mais importantes é equilíbrio tonal e como já disse algumas vezes, o AD8 está entre os melhores, junto com o Focal Clear. É certo que há um acento a mais nos médio-agudos e agudos. Alguns que ouviram o demo universal destacam justamente esse aspecto, mas no custom isso melhora um pouco. Porém, ainda assim, é uma característica dele. E isso é, justamente, o que lhe confere essa sonoridade muito aberta, clara e de uma transparência gigantesca, quase que como um microscópio sobre a mixagem. Isso não quer dizer, entretanto, que ele não tenha graves, ou que sua resposta nas baixas sejam desanimadoras. Pelo contrário. Ao menos para mim, gosto de como ele responde nos graves, ainda que somente quando eles estiverem na gravação. O AD8 não coloca o que não existe naturalmente na música. Talvez por isso, há muita realidade na apresentação. O baixo de Arild Andersen soa extremamente real, além da imagem que isso transmite ao ouvinte. O fato é que há peso, extensão e textura – “Big Boy”, em Main Girl EP, e “Animals – Extend”, do Martin Garrix em Animal; ao mesmo tempo que é rápido, preciso e não menos prazeroso em “Odissey”, do Scale de Summit, álbum The Migration; o álbum todo do Bootsy Collins, em Wourld Wide Funk; e a faixa “Hip Hop After All”, do Guts em Hip Hop After All. Concordo que sim, para algumas gravações, existe a vontade de se ter mais peso nos graves, principalmente em álbuns que naturalmente imaginávamos que isso fosse existir, como, por exemplo, em “Can´t Rely on You” da Paloma Faith em A Perfect Contradiction Outsiders’ Edition (Deluxe). Aliás, esse álbum é uma obra prima e referência para verificar equilíbrio tonal de fones de ouvido. Ouvir no HE-500 e no Denon D7000, parece fazer mais sentido para essas músicas, possivelmente não do ponto de vista da neutralidade, mas sim de uma apresentação emocional, doce, quente e, talvez, divertida.
Vejam, isso não é uma crítica ao AD8, mas uma característica de projeto condizente com a proposta, inclusive da marca AudioDream, com fones monitores. Mas sim, eu posso preferir, em certas ocasiões, uma dose a mais de graves, +1dB, ou 2dB, quem sabe. Em certa medida, guardadas as características intrínsecas de cada tecnologia, o que ouço no HE-6, meu fone mais neutro e analítico hoje, não é tão distante do AD8. Prefiro, inclusive, o que ouço no over, mesmo sabendo que o AD8 é superior tecnicamente na linha da neutralidade e monitoração. E, antes que me pergunte se o HE-6 está sendo devidamente alimentado, te digo com tranquilidade: “sim, está.”
Nos médios e agudos, e na transição entre eles, é onde está a sua maior proeza. A resolução é incrível e é dai que se compreende porque o fone, numa analogia simples, parece atuar como um microscópio na música. Todos os detalhes estão lá e se apresentam muito nitidamente. As vozes são excelentes, bastante reais; os instrumentos tomam um espaço único e ficam muito bem apresentados, cheios e vívidos. O álbum “Mira”, de Arild Andersen, Tommy Smith e Paolo Vinnacia demonstra bem a incrível claridade do AD8. Ele passeia nas apresentações dos instrumentos – contrabaixo, saxofone e bateria. Em cada faixa, esse trio toma uma posição bastante interessante. No início da primeira faixa, o saxofone começa mais melancólico e o contrabaixo compõe para dar esse peso. E a bateria, aqui, está de fundo, sutil, mas no AD8, ela toma uma importância ímpar, o que facilita a leitura dramática da música. Ainda nesta faixa, o contrabaixo do Arild Andersem protagoniza, mais ou menos aos 4 minutos, junto da bateria e já sem o sax, outro cena, e aos 5 minutos e pouquinho, eles voltam para o encerramento. O contrário é na segunda faixa, onde a bateria toma a dianteira logo na abertura, depois aparece o contrabaixo e, em seguida, os três instrumentos têm espaço e pesos incríveis. As faixas são longas no geral e cada uma delas te conta algo que é preciso exatamente dessa clareza e organicidade da apresentação que o AD8 proporciona, para não sentir falta das informações que esse trio quis transmitir com cada faixa. Outro deleite é ouvir Courtney Pine em Black Notes From the Deep.
É claro que toda essas qualidades ficam aparentes em gravações de referência, mas ao ouvir Nevermind, do Nirvana, um álbum clássico e que não é uma gravação de referência, fica exposta a menor qualidade da master, claro. Mas será que fica tão ruim? Logo de cara, na abertura de Smells Like Teens Spirit, quando entra a bateria com a guitarra, há uma massa embolada entre esses instrumentos, mas não parece-me agressivo que seja assim. Esse enrosco dos instrumentos e da voz do Kurt no meio da guitarra e/ou da bateria, segue no CD todo, mas me vem a mente um prazer semelhante ao da adolescência, ouvindo alto, mas sabendo que, agora, ninguém está sendo obrigado a ouvir essa música como naquela época. E o que é (re)ouvir “Come as You Are”? Quem nunca dedilhou esse começo? E Legião Urbana, em “Tempos Perdidos“, também não me parece agressivo ou inaudível, embora toda a parte “brilhante” do álbum esteja, de fato, bem marcada. Há, sim, coisas que estão um pouco mais desagradáveis, embora não inaudíveis. “Não é céu” de Vitor Ramil, com participação de Milton Nascimento, não é no AD8 a melhor das apresentações em um fone; ou quando ouço Gal Costa em Gal a Todo Vapor (live), e Raimundos em Só no Forevis, especialmente a mixagem fraca da música “Aquela”; ou em Lavô ta Novo, onde as imperfeições ficam mais expostas. Ainda assim, me coloco a ouvi-las – afinal, a música continua tocando minha alma.
É interessante fazer um contraponto a essa questão do excesso de transparência em mix ruins. Quando estou no celular, um Galaxy S9 Plus, para essas situações e algumas outras, é comum me ver acionando um efeito denominado “Amp. válvula profissional”, que esquenta as músicas sem matar a apresentação de modo geral. O AD8 recebe bem esses efeitos, sem perder tanto a qualidade própria do fone. E ao menos para mim, que não tem problemas com fones de apresentação mais quente, por vezes colorida – tenho um Denon D7000 – colocar esse efeito, colabora na apresentação e trás benefícios. No Kuba Disco, por exemplo, eu não utilizo o efeito.
E no sentido da proposta do fone, ou seja, equilibrado tonalmente, com um leve acento na transição dos médios para os agudos; monitor, analítico, extremamente resolutivo e transparente, é que chego na questão da espacialidade do fone. Obviamente que a qualidade disso fica melhor evidenciada em gravações de referência e, sobretudo, binaurais. “Robot Lovers”, do Casey Abrams, é um bom teste. O carron toca precisamente a direita, a guitarra a esquerda e o contrabaixo e voz, transitam sutilmente entre essas posições, mas também levemente na vertical. E o ápice é a entrada do sax na música, que aparece para circundar com eles e com você. Isso mesmo: a sensação é a de que ele caminha na música e é possível sentir isso claramente (e na gravação, como pode ser verificado no youtube, esse é o movimento do saxofone). Num bom fone de ouvido over ear – HD800 e HD700, Hifiman Edition X, HE-6, Audeze LCD-3 e outros do tipo, esse aspecto é bem melhor, pois há uma câmara onde você está inserido, como de fato suas orelhas estão. Já em um CIEM, ou IEM, a música é injetada em seus ouvidos e isso trás outra característica para essa questão. Comumente é algo que não se projeta para fora da cabeça, embora seja possível, em certas ocasiões, se projetar um pouco para fora – graças a psicoacústica. É menos espacial, com certeza, mas nesse extremo de resolução e com uma boa dose de realismo, características do AD8, em muitos momentos me pego vendo as posições muito bem definidas de cada artista das bandas, trios, orquestras, enfim. É a espacialidade que se forma subjetivamente, fruto da excelente definição de cada instrumento. Muito bom.
Esse AD8 é meu, e, ao contrário dos outros que já revisei e publiquei, ou que pude curtir com calma aqui em casa para conhecer, ficará para continuar tocando comigo na rua ou no trabalho, lugar onde eu passo mais tempo ouvindo música. E por esse motivo, dada a correria gostosa do lar que me impossibilita de ouvir mais música em fones de ouvido, decidi ter um fone de excelência para ouvir enquanto sou produtivo para a sociedade. Lembro de ter comentado para o Rene e para o Matheus que queria algo do nível do HE-6, mas para ouvir na rua. Obviamente os fones não se assemelham, pois são diametralmente opostos no projeto físico. Porém, subjetivamente, fiquei muito feliz, pois quando o chinês e o brasileiro chegaram, cada um numa época, eu já passara por HE-560, 500 e Focal Elear. Ainda assim, estes dois me impressionaram, tanto o extremamente faminto e não portátil, quanto o extremamente portátil e fácil. O amadurecimento no hobby faz com que as as expectativas diminuam com cada fone que viermos a ouvir, mas felizmente, estes dois chegaram mais cedo na caminhada e continuam me proporcionando muito prazer. E reafirmando o papel da música pelos ambientes que caminho.
Em um diagrama:
AudioDream AD8 – R$5.400
- Intra-auricular personalizado
- 8 armaduras balanceadas por lado: 4 para graves, 2 para médios e 2 para agudos
E quem cantou:
- Man Funk (feat. Leron Thomas) – single;
- Greta Van Fleet – From the Fires / Lover, Leaver
- Supertramp – “Crime of the Century” (Álbum);
- Gorillaz – “Plastic Beach” (Álbum);
- Michael Jackson – “Thriller” (Álbum);
- Funkadelic – “Maggot Brain” (música).
Equipamentos Associados:
- Samsung Galaxy S9+
- iFi micro iDSD BL (DAC);
- Fostex HP-A8 (DAC);
- Chord Mojo;
- Asus Xonar U7;
- Violectric V281 (amp);
- iFi micro iCAN SE (amp);
- Burson Soloist (amp).