INTRODUÇÃO
O estilo de vida mobile em voga nos dias de hoje deu origem à necessidade de ouvir música de maneira conveniente e portátil. E, como os audiófilos também ficam para lá e para cá, os fones de ouvido intra-auriculares personalizados, comuns nos ouvidos de artistas em palcos, acabaram achando uma segunda casa com pessoas comuns, pelas ruas das cidades. Eles oferecem, basicamente, uma incrível relação qualidade de som/tamanho e conveniência.
Marcas como Ultimate Ears, JH Audio, Westone, Sensaphonics, EarSonics, Noble Audio, FitEar e Unique Melody se tornaram comuns. Tenho, aqui, o trio composto pelos três fones mais sofisticados dessa última: Merlin, Miracle e Mentor.
O Merlin, de 2.690 reais, é um design híbrido, contando com duas armaduras balanceadas para agudos, duas para médios e um falante dinâmico para os graves. Já o Miracle, o mais antigo dos três e concorrente direto do famosíssimo JH13 Pro, custa 3.199 reais e traz duas BAs para cada faixa de frequência – graves, médios e agudos –, ou seja, um total de 6 armaduras. Já o Mentor (também já avaliado aqui), topo de linha da fabricante, custa 4.100 reais em versão personalizada, 3.375 em universal e é mais ambicioso: possui um total de dez BAs gerenciadas por um crossover de 4 vias: quatro armaduras lidam com os graves, duas com os médios, duas com os médio agudos e outro par com os agudos.
Apesar de eu já ter avaliado dois desses modelos, um comparativo com os três mais sofisticados da marca é outra coisa. Vamos ver o que é o que!
ASPECTOS FÍSICOS
Os três modelos que tenho em mãos são idênticos, apesar das configurações completamente distintas. O Mentor é o único que é vendido em versão universal – os outros dois são apenas versão de demonstração. Por isso, o que tenho a dizer a seguir, sobre os três fones que tenho em mãos, diz respeito apenas ao Mentor.
Resumindo o que já foi dito em sua avaliação, o Mentor universal é surpreendentemente pequeno para algo que abriga dez alto-falantes. É construído em acrílico e não me parece muito maior que o Sennheiser IE8 que já tive. O acabamento do fone em si é satisfatório e o logotipo da marca metalisado é primoroso, mas sinceramente, acho que o aspecto geral do fone é exageradamente simples para algo que custa mais de 3.300 reais – bem diferente da elaborada placa externa de fibra de carbono e do elaborado cabo com encaixe por mecanismo de rosca do JH Audio Roxanne universal. O cabo, em particular, é muito fino, apresenta o já defasado conector tradicional de monitores personalizados e o divisor Y é uma mera peça de plástico encolhido com calor. Nessa área, definitivamente gostaria de um trabalho mais elaborado da Unique Melody.
Em versão personalizada, no entanto, a história é outra: a marca é justamente conhecida pelo bom acabamento das peças de acrílico, disponibilizadas em diversas cores e, principalmente, pelos impressionantes artworks que consegue imprimir na placa externa dos fones. Fazem os fones da JH Audio – fora o Roxanne de fibra de carbono, é claro – parecerem totais amadores.
Ergonomicamente, os fones em versão personalizada têm tudo para serem ótimos: fones custom bem executados são vistos, por uma grande maioria das pessoas, como alguns dos fones mais confortáveis disponíveis, já que são feitos sob medida para os ouvidos do cliente.
E quanto ao Mentor universal, não tenho do que reclamar: é leve e não achei nem um pouco difícil conseguir um ótimo encaixe aliado a um bom selamento, devido ao completo grupo de ponteiras incluso no pacote – 4 pares de espuma e 4 de borracha, em diferentes tamanhos.
Por falar em pacote, além das ponteiras é inclusa uma pequena case de alumínio que parece indestrutível, uma placa de metal contendo informações sobre o fone, como número de série, um papel com um gráfico de resposta de frequência, um pequeno saquinho de veludo, um paninho, uma ferramenta de limpeza, um adaptador P2-P10 e um adaptador para aviões. Ouviu, JH Audio?
O SOM
MERLIN
Vamos começar pelo mais barato (ou melhor, menos caro). Primeiro de tudo, me impressionou o quanto ele é diferente do que me lembro… fiquei sabendo que a Unique Melody estava trabalhando numa segunda versão do Merlin, e é possível que a que tenho aqui já seja essa versão. Até a publicação desta avaliação, infelizmente não consegui confirmar com a marca. E de toda forma, conforme vamos evoluindo no hobby e tendo mais experiência, nossos parâmetros vão mudando. Mas já deixando claro: ele continua excelente.
A maior diferença é que ele é um pouco menos autoritário do que o que está em minha memória, mas tão energético quanto. A sonoridade é viva e aberta – estando acostumado com o escuro JH Audio Roxanne, ouço uma sonoridade mais leve, com menos médio-graves e médios, e um incremento grande de atividade nos médio-agudos.
Quanto aos graves, confesso que estou um pouco divido. Em termos de qualidade, certamente não tenho do que reclamar. São muito redondos e suaves, porém precisos. A questão é que o objetivo desse fone é ter graves mais fortes – por isso um falante dinâmico dedicado apenas a essa faixa de frequência –, e o que ouço é um resultado muito equilibrado, em nada focado nos graves. De início achei que também era uma questão de costume com o Roxanne, mas uma rápida passada pelos meus outros fones mostra que não é isso. Essa versão de demonstração, pelo menos, não é um exemplo de peso nessa região.
Veja, isso está bem longe de representar um defeito. Gosto muito, muito mesmo, do resultado aqui – são graves extremamente musicais, com excelente textura e equilíbrio exemplar, algo que não é lá muito fácil com um falante dinâmico, principalmente se ele está integrado a um time de 4 armaduras balanceadas. Isso não é nada fácil de implementar e mostra que o departamento de engenharia da Unique Melody sabe bem o que está fazendo. Ao mesmo tempo, para a proposta do fone, acho que mais atividade nessa região seria uma boa adição. Em músicas eletrônicas, principalmente, acho que falta peso para considerá-lo um fone realmente divertido.
Os médios são excelentes. A região me soa muito equilibrada, com excelente transparência e detalhamento e, principalmente, um belíssimo equilíbrio entre doçura e impacto e energia. Ele é capaz de apresentar a voz da Melodie Gardot em toda a sua deliciosa suavidade, exibindo com clareza todas as suas nuances, mas basta trocar para a Blackest Eyes do Porcupine Tree para ser atingido por uma parede de som com a energia e a vigorosidade que se espera de um fone com a promessa de ser divertido. Gostaria de um pouco mais de graves para incrementar a “agressão” e dar peso à coisa, mas o que ouço já é muito de meu agrado.
Também gosto muito da espacialidade proporcionada pela região. Como já disse em sua avaliação, o Roxanne é um fone muito maçudo e cheio, com uma região média muito grossa. Esses três modelos da Unique Melody, ao passo que são mais magros, me trazem um grande incremento em espacialidade. Há mais espaço para respirar, e isso é muito apreciado. Ainda é um in-ear, então não esperem a espacialidade de um full-size, mas há muita competência nesse quesito.
Já nos médio-agudos e agudos, confesso que em muitas situações gostaria de um pouco menos de atividade. O considero um pouco estridente, e em algumas situações há mais foco nessa região do que nos médios e nos graves, e por isso a sonoridade geral acaba se tornando um pouco mais fina que eu gostaria. A resposta natural, aumentar o volume para desabrochar os graves, acaba trazendo mais energia nos médio-agudos do que eu gostaria.
No entanto, não é sempre que isso acontece e a região é de excelente qualidade. Os agudos são muito definidos e transparentes, se também um pouco finos – característica longe de exclusiva do Merlin, vale lembrar. Pratos de bateria têm excelente definição e presença. A região é mais presente que no Roxanne, e em diversos estilos acho que eles ficam ao menos equivalentes.
Por exemplo, fazendo um AxB com o Roxanne ouvindo Esperanza Spalding, acho que a espacialidade do Merlin, aliada à doçura da qual os médios e os agudos são capazes, me traz um resultado no mínimo igualmente interessante. Em alguns quesitos técnicos – principalmente na progressão dos médios aos agudos e na desenvoltura dessa última região – o Roxanne é superior, mas a relativa leveza e suavidade do Merlin tem seus muitos benefícios.
MIRACLE
No encontro de fones, sobre o qual falei no último post, confesso que minhas impressões sobre o Miracle, diante do Merlin e do Mentor, não foi tão favorável assim. Agora, ouvindo melhor em casa, a situação mudou bastante.
Se o Mentor é um fone doce porém energético, o que definine o Miracle é refinamento e transparência. Essas características talvez não sejam tão universais quanto divertimento e suavidade, mas definitivamente têm vez.
Curiosamente, os graves me parecem estar no mesmo nível do Merlin em termos de presença, mas com um foco levemente maior nos médio-graves, enquanto no Merlin há mais peso nos sub-graves. Aqui eles possuem mais impacto e são mais secos, enquanto o falante dinâmico do irmão traz uma resposta um pouco mais gorda e de certa forma esmiuçada. Os bumbos de bateria têm mais força, mais pegada. É como se aqui o destaque fosse o pedal, o chute, e no Merlin o ar deslocado pelo bumbo em si.
Já achei os médios do Merlin excelentes, mas no Miracle as coisas definitivamente melhoram. A região é consideravelmente mais equilibrada. Não acho que o Merlin possua uma resposta tão em V por si só, mas a impressão que tenho ao compará-lo diretamente ao Miracle é justamente essa. Nesse último, os médios são mais coerentes com o resto do espectro. São mais quentes, e conferem às vozes uma renderização mais correta. Há mais corpo, mas sem afetar as proezas espaciais sobre as quais falei na seção do Merlin. Elas continuam firme e fortes aqui.
No faixa Condolence, do incrível EP do Benjamin Clementine (que descobri no Fórum aliás, dica do Zanetti em seu blog http://musicaestranhaeboa.blogspot.com.br/ ), todo o resultado com o Miracle me parece mais coerente, principalmente a qualidade e o timbre da voz. Toda a apresentação me soa literalmente mais linear e equilibrada.
Nos agudos, porém, tenho algumas leves ressalvas: acho que a região também é mais natural que no Merlin, mas ainda ouço alguns picos em regiões altas que, ao mesmo tempo em que trazem transparência e clareza, afetam um pouco a aplicabilidade do Miracle para gêneros mais pesados ou para gravações não tão boas. É como o Sennheiser HD800: em boas gravações o resultado é excelente, mas em outras, os agudos se tornam um pouco ardidos. Em algumas músicas, inclusive, há um pouco de sibilância.
Mas nada que distraia das belíssimas capacidades do Miracle com as gravações certas. É um fone altamente refinado, e possivelmente o in-ear mais neutro que já ouvi, apesar da atividade um pouco alegre nos agudos. Talvez seja, inclusive, o que mais me lembra o Sennheiser HD800.
MENTOR
Ouvindo o Mentor, é evidente que ele se encaixa na mesma linhagem dos outros dois. Ficou claro para mim que a Unique Melody possui uma personalidade própria, visível nesses três modelos. Mas por melhores que o Merlin e o Miracle sejam… o Mentor é outra história. Em suma, ele consegue potencializar a mesma assinatura sonora: melhora o que há de bom nos outros dois enquanto se livra de vários defeitos.
Primeiro de tudo, há mais atividade nos graves, justamente o que eu queria ouvindo o Merlin e o Miracle. Não é um incremento particularmente grande, e ele certamente não chega no volume de graves do Roxanne, mas há mais presença, com uma personalidade que parece estar no meio termo entre o Merlin e o Miracle: ou seja, fica entre o impacto deste e o preenchimento daquele. Ainda esbarro um pouco na questão da proposta, porque de acordo com a Unique Melody o Mentor também é projetado para ser super divertido. Não acho que ele seja frio e estéril (nem perto disso), mas também não o consideraria particularmente divertido. É natural – na minha opinião mais do que o Miracle, apesar de a marca discordar de mim.
Nos médios, mais uma vez temos um aprimoramento. O Miracle é mais natural que o Merlin nos médios porque apresenta mais corpo por meio de uma resposta mais linear na região. O Mentor traz basicamente a mesma melhora, mas de alguma forma é mais suave ao mesmo tempo em que é mais transparente e refinado.
Quanto à região aguda, também estou longe de trazer reclamações. Como disse em sua avaliação própria, os agudos do Mentor estão entre os melhores que já ouvi por conseguirem aliar muita transparência e presença a uma resposta muito suave. Acho sim que eles podem ser um pouco excessivos para os mais sensíveis a essa região – estando acostumado com o Roxanne, há um grande aumento de atividade aqui –, mas é um resultado muito interessante e competente. Inclusive, o Miracle apresenta sibilância mas isso não acontece com o Mentor.
Esse fone me parece um Greatest Hits da Unique Melody. Ou seja, pega dos outros dois o que há de bom e tenta eliminar o que há de ruim. E sim, ele consegue. Trata-se de um in-ear extremamente musical porém natural.
CONCLUSÕES
Está evidente para mim que a Unique Melody está entre a elite dos fabricantes de monitores personalizados. Gostei muito do que ouvi dos três modelos,
O Merlin, apesar de ser posicionado como mais divertido, é um fone muito equilibrado, com graves com boa presença, redondos e suaves, médios que atingem uma bela combinação entre suavidade e energia e agudos competentes, apesar de um pouco ardidos em algumas situações. Se encaixa bem numa vasta gama de estilos musicais, mas gostaria de mais presença nos graves em estilos mais pesados, como hard rock ou música eletrônica, para contrabalancear os médio-agudos mais presentes.
O Miracle é uma oferta ainda mais neutra, e cativa principalmente pelos médios mais encorpados e naturais quando comparado ao irmão mais simples. Os graves são igualmente presentes porém possuem uma personalidade com mais impacto e definição e os agudos são mais coerentes – principalmente na transição a partir dos médios. É possivelmente o in-ear mais neutro que já ouvi, extremamente refinado e transparente. Consequentemente, é melhor aplicado em gêneros mais calmos e que requerem esse maior refinamento, como jazz e música erudita. Para estilos mais novos e gravações piores, talvez não seja a melhor escolha.
O Mentor, por sua vez, parece aliar o melhor dos dois: possui a musicalidade do Merlin e as proezas técnicas, como transparência e precisão timbrística, do Miracle. É um fone extremamente capaz que ainda se mantém não só como um dos melhores in-ears que já testei, mas também um dos melhores fones. Se adequa com maestria a qualquer estilo musical com graves mais presentes, e médios e agudos que atingem, de alguma forma, um equilíbrio espetacular entre suavidade e musicalidade e precisão.
Me parece que os três seguem uma mesma filosofia, mas com toques diferentes. O que é comum, porém, é que os três são fenomenais.
Unique Melody Merlin – R$ 2.690,00 / US$ 879,00
- Design híbrido: duas armaduras balanceadas para agudos, duas para médios e diafragma dinâmico único para graves, gerenciadas por um crossover de 3 vias.
- Sensibilidade (1 mW): 108 dB SPL/V
- Impedância (1kHz): 12 ohms
- Resposta de Frequências: 10 – 19,000 Hz
Unique Melody Miracle – R$ 3.199,00 / US$ 1.049,00
- Duas armaduras balanceadas para agudos, duas para médios e duas para graves, gerenciadas por um crossover de 3 vias.
- Impedância (1kHz): 16 ohms
- Sensibilidade (1kHz): 114 dB/1mW
- Resposta de Frequências: 18Hz – 19kHz
Unique Melody Mentor Universal – R$ 3.375,00 / US$ 1.249,00
Unique Melody Mentor Personalizado – R$ 4.100,00 / US$ 1.449,00
- Duas armaduras balanceadas para agudos, duas para médio-agudos, duas para médios e quatro para graves, gerenciadas por um crossover de 4 vias.
- Impedância (1kHz): 20 ohms
- Sensibilidade (1kHz): 112 dB/1mW
- Resposta de Frequências: 20Hz – 20kHz
Equipamentos Associados:
Portátil: iPod Classic, Sony Xperia Z2
Mesa: iMac, Abrahamsen V6.0, HeadAmp GS-X