Antes de qualquer coisa, gostaria de agradecer imensamente tanto ao meu amigo Tulio pelo empréstimo do HD600 quanto ao Jean Polassi (e ao Lidson pela intermediação e por tornar isso possível), representante da Sennheiser no Brasil, pelo empréstimo do HD650. Sou muito grato pela confiança! Deixo claro, porém, meu compromisso com o leitor: comecei o blog para criar um repositório de avaliações reais e sinceras – coisa que me parece em falta por aí. Esse objetivo nunca será perdido.
OBS: Boa parte das informações históricas sobre esses modelos foi extraída de dois excelentes artigos, os quais recomendo ao leitor: os comparativos do HD580, HD600 e HD650 do Innerfidelity e do Headfonia. Ambos contém informações muito interessantes acerca dos fones. Links ao final do artigo.
INTRODUÇÃO
Sem dúvida nenhuma, uma das marcas mais tradicionais no mercado de fones de ouvido é a Sennheiser. Afinal, além de ter sido pioneira em diversas áreas, é responsável pelos lendários HE90 e HE60 e pelos clássicos HD-25-I-II e HD414. Mas dois verdadeiros marcos na história da marca são o HD600 e sua evolução, o HD650.
O HD600 foi uma versão um pouco melhorada do HD580, um dos primeiros fones dinâmicos considerados high-end. Li há pouco tempo sobre quando Tyll Hertsens o ouviu pela primeira vez – ele é o fundador do site HeadRoom e um dos responsáveis pelo hobby dos fones ter chegado onde chegou. Seu relato é interessante, e ele diz que praticamente todos os fones da época, mesmo os de referência, tinham um som magro e sem autoridade. O HD580 foi quem mudou esse cenário, introduzindo uma assinatura sonora cheia, autoritária e envolvente, sem precedentes no mundo dos fones de ouvido.
Foi lançada uma versão especial, limitada, do HD580 chamada Jubilee. O HD600 foi a versão de produção dessa edição limitada, com algumas poucas modificações, introduzida em 1996. Todos esses eram praticamente o mesmo fone, apenas com mudanças estéticas. O HD600 foi o topo de linha da marca por muito tempo, e se estabeleceu como o melhor fone dinâmico em produção quando se excluía os exóticos, como Sony MDR-R10 e Grado HP1000. Já em 2003, foi lançado o HD650, uma evolução do HD600. São fones parecidos, mas com algumas diferenças que vão além da estética um pouco modificada: o mais novo tinha um equilíbrio tonal diferente, com mais graves e um pouco menos de agudos. É um som mais relaxado, que de acordo com a Sennheiser, veio devido ao entendimento que audiófilos não buscavam necessariamente uma análise clínica da música, e sim uma conexão emocional com ela. As alterações do HD650 são uma tentativa de deixar o fone mais próximo dessa busca.
Mas não é possível dizer que o sucesso foi absoluto. Não são poucos os que ainda preferem o HD600 com sua assinatura mais neutra, nítida e seca, mas sem perder o relaxamento. O HD650 é mais escuro, mais cheio, mais refinado mas ao mesmo tempo menos transparente e mais colorido. Independente das diferenças, ambos são considerados verdadeiros marcos na história dos fones de ouvido, e estão hoje no sweet spot do hobby em termos de custo benefício.
ASPECTOS FÍSICOS
A construção dos dois é muito parecida, mas alguns detalhes os diferem. São majoritariamente de plástico, mas a carcaça do HD600 possui um acabamento azul –na minha opinião de gosto muito duvidoso –, enquanto o HD650 é de um cinza muito mais elegante. O acolchoamento nos dois também é ligeiramente diferente, mas não vejo mudanças significativas em termos de conforto, e as grades também não são iguais: no HD650, são um pouco mais rígidas e têm um tom cinza escuro, enquanto no HD600 são pretas. Finalmente, neste a estrutura dos cups é de um plástico fosco, enquanto naquele é brilhante. Prefiro a estética do HD650, sem a menor sombra de dúvidas.
Ambos são igualmente confortáveis. As almofadas de veludo são macias e cobrem totalmente as orelhas. Eles são leves, e por isso a pressão na parte superior da cabeça é branda. Entretanto, acho que a pressão lateral passa um pouco do limite. No HD650 que tenho aqui, que é novo, ela chega a incomodar, o que não ocorre no já muito usado HD600.
Aliás, um detalhe: esse fone não possui o cabo padrão, que foi substituído por um Cardas. Não sei qual o modelo exato, mas esses Sennheisers especificamente são amplamente considerados fones nos quais um upgrade de cabos é significativo. Porém, as alterações são sempre extremamente sutis – o que posso verificar conectando um cabo em cada lado e ligando os dois ao GS-X –, e aqui não é diferente: há apenas um levíssimo incremento na transparência, com um resultado que apresenta um pouco mais de brilho e definição nas frequências mais altas. As distinções são sutis o suficiente para tornar praticamente irrelevante o upgrade do cabo nessa comparação, já que as características que separam um fone do outro são de outra magnitude.
Por falar em cabos, eles são removíveis nos dois fones e têm a vantagem de possuir um negativo e um positivo para cada lado. É um sistema que torna o balanceamento muito mais fácil. No AKG K701, por exemplo, isso é muito mais difícil, já que para isso deve ser feito um furo no lado que não possui entrada de cabo e fazer o que é chamado hardwire. Aliás, o cabo dos dois Sennheisers é diferente. No HD650, a junção dos dois negativos é feita no conector, portanto é possível apenas reterminar o cabo original para torná-lo totalmente balanceado. É a solução mais simples e com o menor custo. No HD600, essa junção é feita no divisor em Y, o que torna necessário um recabeamento completo para que ele seja balanceado.
Os dois têm um acabamento bom, condizente com o preço, mas esteticamente são mais simples que os concorrentes da AKG e Beyerdynamic. Parecem seguir a máxima “forma que segue função”, sem mais nem menos. Simples e eficazes. A embalagem, aliás, é interessante, de plástico com um molde interno de espuma. O único acessório incluso é um adaptador P10-P2.
O SOM
Os Sennheisers são conhecidos pelo som relaxado, e essa é exatamente a primeira impressão que se tem. São quentes, convidativos e, de alguma forma, simples. Existem diferenças entre eles, mas sinceramente, elas são muito mais sutis do que eu me lembrava. É como se fossem dois temperos diferentes para uma mesma coisa.
Os graves são uma diferença, mas são muito competentes em ambos os HDs. Há uma boa quantidade – um pouco maior no HD650 –, e os dois apresentam ótimo impacto, textura e definição. O HD600 sai na frente nesses aspectos, e é mais definido e preciso. Nele, acho que os graves estão, sinceramente, no ponto da passividade. Fones como o HE500 e o JH13 trazem um pouco mais de vontade nessa região, mas sinceramente, acho que o HD600 está mais perto do que considero natural. Os outros dois têm um boost muito bem colocado e divertido. O HD650 não está longe, e se adiciona um pouco mais de gordura e vida aí, o que pode acabar obscurecendo um pouco os médios, não saiu dessa consideração.
Partindo para os médios, a situação continua assim. Temos muita desenvoltura e uma apresentação extremamente natural nos dois casos. Mas é essa região que, na minha opinião, mostra melhor as diferenças entre os fones. O HD600 detém um qualidade muito clara e simples. Os médios são simplesmente médios como devem ser. O curioso é que essa não é uma qualidade que salta aos ouvidos, ela só existe. Quando o ouço, não sinto nenhuma falta ou excesso, ele cumpre o seu papel sem maiores pretensões. Uma voz é uma voz, uma guitarra uma guitarra e um piano um piano. Exatamente como deveriam ser.
O HD650, porém, com seu leve incremento nos graves e agudos e um pequeno vale nos médio-agudos em comparação ao irmão mais velho, acaba soando mais escuro e menos transparente, além de menos direto. Os médios são mais recuados, o que aumenta a sensação de velo (o famoso Sennheiser Veil), reduzindo a transparência, mas em compensação tornando a apresentação mais refinada e menos crua. O palco sonoro, que é correto mas não grande nos dois fones, também sai ganhando. Aliás, transparência não é o forte dos dois, assim como arejamento. Eles não tentam escavar a gravação atrás dos mais ínfimos detalhes, a prioridade é sempre a naturalidade e a musicalidade. É o todo, e não as partes. Mas, nesse quesito, o HD600 é sem dúvida mais apto, apesar de nenhum dos dois serem exemplos em detalhamento. Porém, isso faz com que eles sejam extremamente tolerantes a arquivos ou gravações de baixa qualidade.
Um único detalhe que pode incomodar um pouco é que ouço uma certa granulação em ambos, mas mais destacada no fone mais antigo. Devido à apresentação espacial mas não tão aberta e aos médios mais pronunciados, falta suavidade em sua apresentação. O HD650, com seus médios mais recuados, acaba resolvendo esse problema, mas a um custo – prefiro a apresentação do HD600. De toda forma, guitarras soam mais “rasgadas” do que estou acostumado. Hesito em chamar essa característica de um defeito, mas devo confessar que algumas vezes sinto falta do refinamento proporcionado pelo HD650 nesse aspecto, que apresenta uma maior suavidade.
Nos agudos, trago muitos elogios. Já disse uma vez que o HD600 está entre minhas referências nessa região, à qual sou extremamente sensível. Aliás, há pouco tempo estive num show acústico, onde ouvi novamente um chimbal sendo tocado do meu lado. Seu som naturalmente possui um corpo e um spike que pouquíssimos fones conseguem reproduzir de forma convincente. O HD600 é, definitivamente, uma das raríssimas exceções. Seus agudos são, sem a menor sombra de dúvidas, um dos três melhores que já ouvi até hoje. Possuem uma naturalidade e uma desenvoltura de tirar o chapéu. Os picos parecem sem colocados com uma precisão incrível, de forma a criar o que poderia bem ser a renderização mais correta de pratos de bateria que conheço. A It Could Happen to You, da Diana Krall, além das minhas tradicionais referências I’m Jim Morrison I’m Dead e You’re Lionel Richie são um claro exemplo de suas proezas.
Os picos normais de fones nessa região são em registros muito altos, o que geram aquele som fino e sem corpo que tanto me incomoda. Aqui, no entanto, os picos estão mais baixos, e não tiram corpo algum dos instrumentos mais agudos. Apenas parecem reproduzir da maneira mais correta possível o brilho real desses instrumentos. O HD650 mantém boa parte dessas qualidades, mas devido aos médio-agudos mais recuados, o resultado me parece um pouco menos correto, já que esse brilho acaba se destacando um pouco mais. Mas, ainda assim, está acima da média.
Por fim, apesar da impedância alta, os dois fones são surpreendentemente fáceis de serem empurrados. Tive bons resultados ligando-os diretamente à saída de um MacBook Pro. Saídas comuns de equipamentos de som também são aceitáveis, e até mesmo um tocador de mp3 comum pode trazer um som surpreendentemente respeitável. Sinceramente, eu viveria feliz com um HD600 ligado a um iPod. Mas, é claro, isso não significa que ele não melhore com equipamentos de nível mais alto. Isso definitivamente acontece. Mas gosto da ideia de ter um fone que toque muito bem num equipamento qualquer e que escale para resultados mais pretensiosos com equipamentos melhores, mostrando o que o resto dos equipamentos está fazendo.
CONCLUSÕES
Acho que em boa parte do texto mostrei pouca empolgação. A grande questão dos Sennheisers HD600 e HD650 é que, com eles, o todo é muito maior que a soma das partes.
Nenhum deles possui características particularmente excitantes, ou qualidades que saltam aos ouvidos – bem, talvez os agudos do HD600, mas na minha opinião esse ainda é um detalhe perante o todo – mas, ao mesmo tempo, suas apresentações são incrivelmente naturais e competentes em todos os aspectos. Ao mesmo tempo que praticamente não existem proezas notáveis, também não enxergo defeitos significativos.
Não sei explicar… mas é como se eles – particularmente o HD600 – tocassem de uma forma tão simples, tão puramente competente e sem empolgação em nenhum aspecto, que acabam por criar uma apresentação que não excita, que não chama atenção em nada. Ela é exatamente como se espera, e o fone simplesmente sai do caminho. É engraçado, porque não acho que eles possuam a neutralidade de um HP1000 ou de um Orpheus. Não é esse o ponto. Mas a Sennheiser conseguiu criar, com esses dois fones, ferramentas de auto-negação. Você coloca o fone, e esquece que colocou porque é como se ele não estivesse lá.
E é angustiante não saber explicar direito a sensação, porque não é a transparência de um Orpheus ou a crueza de um HP1000. É uma presença de tudo que acaba se tornando uma falta de tudo. Todas as características, novamente no HD600 em especial, estão exatamente onde deveriam ser para ser ao mesmo tempo o tudo – por não haver faltas – e o nada – por desaparecer. Eu não sou nem um pouco empolgado com nenhum dos dois, porque não há nada neles que me chame a atenção. Mas justamente por isso, eles somem. E quem fica é a música.
O HD600 é meu favorito, porque me parece mais neutro. Nele, essas características são muito mais evidentes. Em compensação, o HD650, que é mais em V, é mais refinado e mais envolvente, apesar de menos íntimo. Pode ser mais divertido, mas eu, sem a menor sombra de dúvidas, fico com o HD600 – principalmente levando em consideração os 100 dólares de diferença entre eles. Lá fora, o HD650 custa 499 dólares, enquanto o HD600 pode ser adquirido por 399.
A grande questão, de qualquer forma, é que os dois têm, apesar de em diferentes proporções, uma mesma capacidade. É curioso, porque se olharmos as partes, não há como saber. Eu não sei dizer o que acontece, porque olhando para cada característica deles, não vejo praticamente nada em especial. Mas, como disse antes, por razões que vão além da minha compreensão, o todo acaba sendo muito maior que a soma das partes. O resultado do conjunto aqui é uma capacidade que, na minha opinião, é (ou deveria ser) o sonho de qualquer audiófilo: eles desaparecem.
LINKS:
http://www.innerfidelity.com/content/very-important-sennheiser-hd-580-hd-600-and-hd-650
http://www.headfonia.com/the-sennheiser-trio-hd580-hd600-hd650/
Especificações Técnicas
Sennheiser HD650 – R$2.599,00 (US$499,00)
- Driver dinâmico único
- Impedância (1kHz): 300 ohms
- Sensibilidade (1kHz): 102 dB/1mW
- Resposta de Frequências: 10Hz – 39,5kHz
Sennheiser HD600 – US$399,00
- Driver dinâmico único
- Impedância (1kHz): 300 ohms
- Sensibilidade (1kHz): 102 dB/1mW
- Resposta de Frequências: 12Hz – 39kHz
Equipamentos Associados:
Portáteis: iPod Classic
Mesa: iMac, MacBook Pro, Cambridge Audio DacMagic, Electrocompaniet ECD-1, JVC A-S5, HeadAmp GS-X
Onde Encontrar