INTRODUÇÃO
Vou começar sendo sincero e dizendo que não me sinto confortável em fazer uma avaliação de um amplificador. Como eu já disse numa outra ocasião, para mim, fones ou caixas, excluindo-se a gravação, são 80% do resultado. Portanto, se o amplificador ou fonte atingirem uma qualidade mínima e se o amplificador for minimamente capaz de empurrar o fone ou caixa em questão, a diferença entre amplificadores diferentes não vai ser gritante, e a satisfação com o resultado final vai depender puramente de sinergia e do gosto do ouvinte – e não nas capacidades técnicas do amplificador. É nisso que acredito.
Meu teste do Electrocompaniet ECD-1 versus o Cambridge DacMagic me foi revelador nesse sentido. Apesar de custar quatro vezes o preço, preferi o resultado com o DacMagic no meu sistema. A questão é que ele tinha mais energia e um detalhamento mais aparente. O Electrocompaniet é muito mais analógico e “anestesiado”, tem menos atividades nos agudos e também nos graves. As outras virtudes, como palco sonoro, dinâmica e etc. ficam totalmente em segundo lugar na minha opinião, porque o mais importante num equipamento é o equilíbrio tonal e o timbre, que são as características que vão determinar a assinatura geral dele e o quão bem ele se comporta num sistema. E a pergunta que faço é: como dizer quem está mais certo, se o resultado final vai ser fortemente determinado pelo final da cadeia – o fone, no meu caso? Se eu estiver ouvindo um fone muito agressivo, como um Grado SR325i, provavelmente vou preferir o ECD-1. E aí vou apreciar sua espacialidade e refinamento maiores. Porém, com um HiFiMAN HE500, Stax SR-007 ou Grado HP1000, o resultado com o DacMagic é mais satisfatório. E o problema é que não adianta ter um palco maior – o equilíbrio tonal do sistema com o Cambridge acaba sendo o fator decisivo.
Entendem o que quero dizer? Amplificadores e fontes, mais do que outros componentes, na minha opinião, dependem muito dos outros componentes para que sua performance seja determinada. Normalmente não existe melhor ou pior (bom, às vezes sim, como vi quando testei o Burson HA-160D vs. EMM Labs Meitner CDSA), existe o mais apropriado. Independente disso, vou fazer um comparativo, com objetivo de entreter e de falar sobre a performance de um protótipo de amplificador que está para chegar ao mercado em breve. Aqui, ele já vai enfrentar uma competição de peso: o Meier Audio Corda Eartube.
Não sei se estou autorizado a falar muito sobre o The Secret (dá até para fazer um trocadilho), mas mesmo que esteja, não sei basicamente nada a respeito. Chegou até mim através de um amigo, e a proposta é ter um “wire with gain”, ou seja, um amplificador absolutamente neutro e transparente que simplesmente amplifica o sinal da fonte, sem impor qualquer característica sônica a ele. Devo confessar que já ouvi isso diversas vezes a respeito de diversos equipamentos, e não sei até onde esse é o caso, mas atualmente, essa característica é uma que tendo a valorizar.
Já o Eartube é um amplificador valvulado desenvolvido para o Jan Meier pela Audiovalve, conceituada fabricante alemã de equipamentos high-end. Foram fabricadas poucas unidades e como consequência eles são consideravelmente raros. Após alguns problemas entre os dois colaboradores, eles passaram a ser comercializados pela própria Audiovalve, e hoje existe uma segunda geração. Vale dizer que, apesar de o projeto ser quase inteiramente da fabricante alemã, Jan Meier colocou seu famoso circuito de crossfeed no Eartube. Trata-se de um meio de resolver a falta de capacidade de criar um palco convincente inerente de fones de ouvido, fazendo com que informações de um canal vazem para o outro.
Vejam que não sei quanto o The Secret vai custar. Portanto, a comparação será feita às cegas, sem levar preço em consideração: estou avaliando puramente a performance dos dois – para o bem e para o mal. Pode ser justa, se o preço for parecido, ou injusta, caso o The Secret venha a custar menos.
ASPECTOS FÍSICOS E CARACTERÍSTICAS GERAIS
O The Secret ainda é um protótipo, portanto não vou falar sobre suas características físicas. Vou dizer, porém, que ele é realmente potente – consideravelmente mais que o Meier. Há um problema com o ganho, que é excessivamente alto, o que chega a ponto de torná-lo praticamente inutilizável com um JH13Pro, mas acredito que isso vá ser corrigido na versão de produção. Ele possui uma entrada e um loop out, extremamente conveniente e pouco comum em equipamentos hoje. É basicamente um loop, ou seja, é possível colocá-lo entre uma fonte e um outro amplificador – para outro fone ou para caixas de som (errata: “a saída dele na verdade não é um loop out, e sim uma saída amplificada, que pode tocar um power fazendo do Secret um pré amplificador de alto ganho, ou ainda tocar caixas de alta eficiência” – Guto Pereira, meu amigo que emprestou o The Secret para essa avaliação).
O Eartube é um produto bem luxuoso em termos de materiais e acabamento, que refletem seu preço. É todo de metal, com uma pintura preta metálica, de densidade relativamente alta. O que impressiona, no entanto, é o esmero no acabamento: todos os switchs são daquele tipo industrial – bonitos, resistentes e funcionais, com um click preciso que parece seguir o conhecido padrão automobilístico alemão. Passam uma grande impressão de solidez. Isso aliás é o que o Eartube passa. Não existem folgas ou detalhes. É um produto de luxo e com um acabamento que, sozinho, parece justificar o preço. O botão de volume é enorme – também de metal, mas cromado – e conta, na parte traseira, onde ele se encontraria com o painel frontal, com um pedaço de feltro, para que ele não arranhe o amplificador. Esse mesmo material se encontra nos pés do Meier, que diga-se de passagem, são também grandes cilindros de metal cromado.
Isso não significa, no entanto, que ele seja bonito. Na minha opinião não é, apesar de saber que muitos o acham. Seria melhor se o design fosse feito de modo que as válvulas ficassem expostas, mas infelizmente na Europa isso não é permitido. De toda forma, é interessante que para mim, ele desperta um sentimento diferente, que o B&W P5 também despertou: pride of ownership, algo como orgulho de propriedade. Ele se impõe, e tê-lo na mesa é no mínimo muito satisfatório.
Na parte frontal, temos duas entradas single ended da Neutrik. O interessante é que elas são híbridas. São single ended, mas é possível conectar um XLR 3 pinos nelas, assim como um P10 comum. Ou seja, é possível ligar um fone balanceado – com dois XLR 3 pinos – no Eartube, usando as duas saídas. Na traseira, temos duas entradas RCA de ganhos diferentes. Esse é um amplificador extremamente potente, suficiente para o K1000, então a menos que você pretenda usá-lo com esse AKG ou com um HiFiMAN HE6, a de ganho baixo já vai ser mais do que o suficiente.
Outro aspecto importante é a presença do crossfeed, que como dito anteriormente, é um meio de melhorar a capacidade de imagem dos fones. O efeito é longe de ser dramático, mas é perceptível e na minha opinião torna a audição mais prazerosa em muitos casos, como em gêneros acústicos. Nessa avaliação, porém, o efeito será desligado.
O SOM
Nessa seção, vou testar um novo formato. Como estou fazendo testes com diferentes fones e como as diferenças são relativamente sutis e puramente dependentes de sinergia, vou colocar minhas impressões com cada fone que tenho à disposição para fazer o teste.
Antes, porém, uma consideração que para mim não é importante, mas sei que para outras pessoas é fundamental: ruído de fundo. No meu sistema, com os fones full-size, não ouço ruído no Eartube. Há microfonia das válvulas, mas isso é comum. Devo dizer, no entanto, que as válvulas Telefunken que tenho são insuportáveis devido à microfonia. É normal ouvir um pouco, mas com elas é impossível aguentar. Ouço música quando estou no computador, e o simples passar do mouse sobre a bancada é audível no Meier, mesmo com música tocando. Mas é um problema exclusivo desse par de válvulas, então uso as GE.
Já o The Secret é totalmente silencioso com os full-sizes. Apenas o JH13Pro apresenta ruído de fundo, mas não é audível se eu estiver ouvindo música.
1) JH13Pro
Como disse ao início, minhas impressões com o JH13Pro são escassas porque, com o botão de volume no The Secret posicionado assim que o balanço entre os canais se torna equivalente, o volume já é muito acima da minha zona de conforto. É uma pena, visto que esse é meu fone mais revelador. De toda forma, imagino que esse problema seja sanado na versão de produção.
A primeira diferença que notei é relativa ao impacto nos graves. O The Secret definitivamente tem mais autoridade nessa área. Nunca ouvi tamanho impacto no JH13! Os bumbos têm mais vida, é quase possível sentir aquele “ventinho” nos ouvidos. Os graves não se tornam exagerados de forma alguma, apenas têm mais impacto e um pouco mais de vigor. Também são mais definidos e secos quando comparados ao Eartube.
No entanto, nos médios o Meier se sai melhor. São mais doces, refinados e têm mais definição. Na faixa Tears of Joy, do Antonio Forcione, a percussão parece ter mais vida, e a gravação ganha mais ambiência. Veja, porém, que essa definitivamente não é uma diferença gritante. Está ali, mas não chama tanto a atenção. Nos agudos a história se repete. Apesar de eles terem um pouco mais de presença no The Secret, o Eartube apresenta os registros mais altos com mais elegância e compostura. É uma audição mais doce.
2) AKG K1000
Com o AKG, enxergo uma situação parecida. O Meier prioriza uma audição mais doce, quente e encantadora, enquanto o The Secret é mais frio. Note que aqui é puramente uma questão de gosto. Podem ter certeza de que vou preferir as apresentações diferentes de cada um em momentos diferentes. Ouvindo Solidão, da Ana Caram, fico cativado pela voz de veludo da cantora no Eartube, que inclusive apresenta uma espacialidade maior. É uma apresentação mais arejada e com um palco sonoro consideravelmente maior e mais tridimensional.
O The Secret também encanta por razões diferentes, em situações diferentes. Em música clássica, o equilíbrio tonal é diferente, com os graves mais presentes e definidos, com maior impacto, médios um pouco mais comedidos e agudos mais extensos e com maior presença. Nesse estilo, textura é fundamental, e nesse quesito a doçura e maciez do Eartube podem ficar para trás diante da relativa secura do The Secret, se essa for a prioridade. Porém, ainda nesse estilo, a tridimensionalidade do Meier acaba fazendo falta.
3) Grado HP1000
Com o Grado HP1000, a situação se inverte. A apresentação com o The Secret é consideravelmente mais do meu agrado. A melhor capacidade de lidar com os graves, com mais controle, assim como a maior presença dos agudos, ajudam a ampliar o que há de melhor no HP1000 e reduzir o que não é tão bom.
Os graves têm mais impacto que no Meier, assim como uma presença um pouco maior também. Os médios são realmente doces com o Grado, e como eles são um pouco recuados em relação ao Eartube, acabam sendo muito mais agradáveis. Agudos um pouco mais para a frente foi justamente o que pedi do HP1000, e o The Secret foi capaz de realizar meu pedido. Novamente, não é uma diferença dramática, mas ela existe.
O Meier, em comparação, tem os médios um pouco mais ressaltados, o que não é ruim – minha avaliação glorificando o HP1000 foi feita com esse amplificador –, mas a questão é que o que ouço no The Secret se encaixa ainda melhor no que busco para esse fone. A questão da espacialidade não é tão importante nesse caso não só porque o Grado já não é incrível nesse quesito, mas também porque nos estilos que ouço com ele, essa característica não é fundamental.
4) HiFiMAN HE500
Na minha opinião, o HE500 é o rei da música eletrônica: os graves são realmente presentes, incrivelmente extensos e com peso excepcional. Os agudos têm um pico que os tornam estranhos para diversos estilos, mas em eletrônica, que já é geralmente artificial, eles adicionam um brilho muito interessante. É sem dúvida alguma o melhor que já ouvi nesse gênero.
O The Secret novamente se sai melhor, justamente por ter um maior controle dos diafragmas ortodinâmicos do HE500 – os graves conseguem mais impacto e um pouco mais de presença. Porém, muitas vezes espacialidade é algo interessante em música eletrônica, e nesse quesito o Meier é mais bem resolvido. Neles, os agudos também são um pouco mais comportados, o que para o HiFiMAN é interessante.
Com jazz, os dois ficam ainda mais próximos: ao mesmo tempo que o Eartube é fantasticamente doce, a definição e secura do The Secret também são fenomenais. O problema é a presença dos agudos, que aliada ao pico do HE500, pode incomodar em algumas situações muito específicas.
5) Beyerdynamic DT880 Premium 600 ohms recabeado com ZXAC Nucleotide
Não sou nem um pouco fã do DT880 Premium, mas confesso que fiquei surpreso com o que ouvi da versão recabeada. Ao mesmo tempo que não sou o maior crente em cabos, confesso que o que estou ouvindo desse par é diferente, e muito melhor, do que a memória que tenho desse fone – mas não sei até onde posso confiar em minha memória.
De qualquer forma, é inegável que estamos falando de um fone frio. Os agudos são proeminentes (mesmo domados pelo recabeamento) e os médios ainda relativamente velados. Essa personalidade acaba se dando melhor com o Eartube: seu calor, assim como os agudos mais comportados, acabam o tornando um par mais indicado para o DT880. Os médios ganham vida – evidente principalmente nos vocais mais encorpados –, e o resultado final acaba por ser consideravelmente mais satisfatório.
O par com o The Secret está longe de ser ruim; mas os dois têm características semelhantes, então pareá-lo com um amplificador que de certa forma é seu oposto acaba sendo mais interessante – os defeitos são cancelados.
CONCLUSÕES
É muito difícil tirar conclusões concretas sem ter ideia do preço com o qual o The Secret chegará ao mercado. Há também o fato de ele ser um protótipo. Aparentemente está quase finalizado, mas não sei se é possível que ainda haja mudanças.
As diferenças entre os dois amplificadores em questão, no entanto, ficaram relativamente claras, porque eles têm propostas diferentes: enquanto o The Secret é mais frio e neutro, o Meier Corda Eartube está com os dois pés no lado eufônico, priorizando uma apresentação mais calorosa e doce. Escolher entre um e outro é uma questão de gosto. Em compensação, em alguns aspectos, a superioridade do Meier ficou evidente: ele é sem dúvida mais tridimensional, capaz de criar um palco com arejamento e recorte consideravelmente mais convincentes. O The Secret, em comparação, é bem mais chapado.
Mas deve-se ter em mente que estamos falando de um amplificador de fones high-end alemão, que custava quase 2 mil euros – e, podem ter certeza, o The Secret se segurou muito bem ao lado dele. Vejam que em duas ocasiões acabei preferindo sua apresentação, apesar de conseguir ouvir que, nesses casos, em alguns aspectos o Eartube ainda se saía melhor.
O Meier Corda Eartube mostrou a excelência que seu preço indica: é um amplificador fantástico, verdadeiramente high-end em todos os sentidos – não só em termos de sonoridade, mas também de luxo.
Já o The Secret se mostrou como um belíssimo amplificador – só o fato de eu tê-lo comparado ao Meier, e ainda o preferindo em duas situações –, já deveria ser o suficiente para mostrar isso. Seu sucesso dependerá do preço, mas que temos aqui um produto nacional de altíssima qualidade, não tenho a menor dúvida.
ESPECIFICAÇÕES: Meier Audio Corda Eartube
- 2 headphone outputs
- Maximum output: 30V at 100 Ohm, 15V at 20 Ohm
- Gain factor 16 dB (at 200 Ohm load)
- Variable crossfeed filter switch: stereo or low level crossfeed
- 2 pairs of inputs: Input impedance 47 kOhm
- Gold-plated input jacks.
- Silver plated headphone jacks (Neutrik).
- Silver plated heavy duty switches.
- Alps-potentiometer for volume control.
- 110V and 220V versions available.
- Built-in groundloop breaker.
- Regulated voltage lines.
- Weight: 6 kg.
- Size: 28 x 30 x 11 cm
Equipamentos Associados
iMac, Electrocompaniet ECD-1, Cambridge Audio DacMagic